Falar em “rombo da Previdência” é desonestidade intelectual. É o que diz o economista Eduardo Fagnani, professor da Unicamp, parte de um grupo de especialistas que prepara um documento para se opor à reforma da Previdência proposta pelo governo de Michel Temer. A iniciativa é do Dieese (Departamento Instersindical de Estatística e Estudos Socioecônomicos) junto com a ANFIP (Associação Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil).
“Não tem rombo. Isso é pedalada constitucional, contabilidade criativa”, continua Fagnani. O economista explica que os artigos 194 e 195 da Constituição dizem que a Previdência faz parte da Seguridade, assim como a Saúde e a Assistência Social. Para financiar todos esses setores, foram criadas fontes de financiamento, constitucionalmente vinculadas: a contribuição do trabalhador, da empresa e do governo, estas sobre o lucro e o faturamento. “Desde 1989 até hoje todos os governos passaram a mão nos recursos das contribuições sobre o lucro e o faturamento e continuam contabilizando como receita da Previdência apenas a do trabalhador e da empresa. O rombo é a não contabilização da parcela do governo. Em 2015, as contribuições do trabalhador e da empresa não foram suficientes para cobrir a despesa do INSS urbano e rural, essa diferença foi de R$ 91 bilhões. Isso poderia ter sido coberto com parte dos R$ 201,6 bilhões arrecadados pela COFINS e dos R$ 61,2 bilhões arrecadados pela CSLL; ou então, pelos R$ 63,4 bilhões capturados da Seguridade pela DRU e pelos R$ 157 bilhões de desonerações e renúncias de receitas pertencentes ao sistema de Seguridade Social”.
Segundo Fagnani, o grupo deve se juntar à frente criada pela OAB contra a Reforma da Previdência. Para o economista, o projeto do governo se inspira em países desenvolvidos da Europa, mas com regras ainda mais rigorosas: “Não faz sentido um país que sequer conseguiu resolver as desigualdades do século 19 ser submetido a regras de países que são incomparavelmente mais igualitários sob qualquer indicador que você queira analisar. O Brasil é um lanterninha global, está na C”.
Outro ponto crítico seria o tratamento igual dado a desiguais, diz Fagnani: “Eles estão querendo fazer regras únicas para situações diferentes. Não há como comparar a situação do trabalhador rural e do urbano, da mulher e do homem, de Maranhão e de São Paulo, do funcionário público com o trabalhador do INSS. O Brasil tem uma profunda heterogeneidade estrutural. É justo que o trabalhador rural do nordeste esteja submetido a regras mais rigorosas que aquelas exigidas do trabalhador urbano da Dinamarca?”
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