Toda Flip tem um escritor que se destaca e surpreende. Curiosamente, é comum serem portugueses. Basta pensar em Valter Hugo Mãe e António Lobo Antunes. Com Matilde Campilho não foi diferente. Há talvez um amor distante entre Portugal e Brasil que, nos momentos de proximidade, se revela intenso. Independentemente disso, são três autores que falam um pouco como escrevem, ou seja, excepcionalmente, com beleza e inteligência.
Ladeada pelos também poetas Carlito Azevedo, de Monodrama, e Mariano Marovatto, que está lançando Casa (7 Letras), ela brilhou em vários momentos. Logo no começo, falou do “pouquinho de medo” que sentia de estar ali diante do público e isso porque “poesia é uma coisa que a gente faz em casa, no restaurante, eu me defendo sozinha contra o papel, aqui é outra coisa.” Como disse Azevedo, ela almeja a invisibilidade.
Mas seu carisma falou mais alto que a timidez. Ao ler seus poemas, gesticulou com as mãos, deu o ritmo com pausas e mudanças de volume, olhou com intensidade. E isso com naturalidade; não era meramente performance, mas uma entrega. Os aplausos entusiasmados o confirmavam. Seus amigos (e até certo ponto mentores) foram entrando na mesma sintonia: Azevedo com intervenções inspiradas e Marovatto, que também é músico refinado (tem quatro discos lançados), com humor e franqueza.
Este último, especialista na obra de Cacaso e Ana Cristina César, disse ter começado a fazer letras de música e poesia porque ficou apaixonado. Mas que passou a escrever melhor quando deixou de sonhar com o futuro e se ateve ao presente. Para Matilde se deu o contrário: ainda que tenha estudado letras e história da arte, “fui começando a me instruir como poeta distraidamente”. E acrescentou: “ser poeta é uma profissão para sempre, nem dormindo a gente descansa.” Contou ainda que, quando dizia que era poeta e lhe perguntavam: mas você vive de quê? “Vivo muito feliz” era a resposta.
No final, ambos defenderam a importancia da poesia no combate à violência no mundo. Marovatto reforçou os dizeres de sua camiseta, “Publique ou Morra”, lema de Julien Assange da Wikleaks. E Matilde falou na alegria que a arte pode trazer para quem está sofrendo: “A poesia não salva o mundo, mas salva um minuto. A gente está aqui para dançar sobre os escombros. E estamos juntos.”
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