Faz mais de um ano que venho dizendo que essa bola da Copa não é de confiança. Agora, dá para montar uma seleção campeã, com jogadores de todo o mundo, que reclamam da pelota. Durante a Copa das Confederações, em 2009, notei que o balão parecia ter o diabo no couro (que, aliás, não é de pele de bicho, mas feita de material sintético). Lembro-me de que consultei meu guru, Seu Nunzio Carelli. “Seu Nunzio, essa bola não é muito católica. Ela é arisca, muitas vezes não rola, mas desliza pela grama e dá a impressão de ser mais leve”. Ao que o sábio respondeu de bate pronto: “Também notei. É uma bola brincalhona”, disse.
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A fabricante Adidas defende-se dizendo que a mesma esfera foi usada durante a final da Liga dos Campeões, vencida pela Inter de Milão. Deu para reparar. Vamos ao videotape: conte quantos passes laterais saíram errados, transformando lançamentos em verdadeiros petardos impossíveis de aproveitamento pelos alas ou atacantes.

Quando um jogador erra seguidamente os passes, a culpa é dele. Se o time todo está em desacerto, a culpa é do técnico. Caso os dois times em campo apanhem da bola, a culpa é do gramado. Mas se todos os esquadrões de um torneio repetem o equívoco, tá na cara que a pelota é esquisita. Foi o que ocorreu durante a Copa das Confederações.

A Jabulani (significa “celebrar” em zulu), nome oficial da redonda matreira, não tem costuras: é unida termicamente. Talvez seja essa tecnologia toda que faça a gorduchinha deslizar pela grama. Note-se: muitas vezes, ela não rola como deveria. Essa característica dá maior velocidade à esfera. É, mais ou menos, o que acontece quando se joga em campo molhado ou na lama dura. Nesses casos, o jogador tem de repensar seus cálculos instintivos para a corrida que o fará interceptar a trajetória do balão. Trata-se de algo difícil e contraintuitivo. É necessário dar mais tratos à bola, ao pé da letra.

Tem mais: o goleiro Leão – homem por quem não tenho grande estima, mas que reconheço como um dos maiores arqueiros do Brasil – contou, certa vez, como era sua técnica para saber aonde a bola iria, depois de chutada contra suas balizas. Disse que observava como a pelota vinha rodando no ar. Pode ser mais uma cascata do jogador, já que o procedimento exige visão de águia para notar esse giro. Mas eu acredito nele. E o goleirão Júlio César confirma que a Jabulani é imprevisível. Não está sozinho entre os colegas com a responsabilidade da guarda dos paus. O italiano Buffon, tido como o melhor do mundo, também resmunga sobre essa gorduchinha despirocada.

Antecipo que no mundo todo se ouvirão urros furiosos das torcidas contra a transviada esfera. Teremos a materialização da expressão: “Dá nele, bola!”. Saudosista que sou, recomendo a solução da volta ao passado. Na minha época, as pelotas não exibiam onze cores, como a Jabulani atual, com sua roupagem e comportamento de palhaço. Tínhamos apenas duas opções: marrom (para jogos diurnos) e branca (para os noturnos). E vinham cheias de gomos, costurados laboriosamente. Era necessário muito carinho na manutenção do artefato. Depois de uma partida renhida, debaixo de chuvarada bíblica, cumpria-se o ritual de passar em um açougue, pedir um bom naco de sebo, para ser aplicado na superfície dessa amante exigente, quando a pele estivesse seca. E, depois disso, só se errava passes por grossura.


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