Com narrativa poética, “O Piano Que Conversa” conquista o público do In-Edit Brasil

O pianista Benjamin Taubkin, protagonista de O Piano Que Conversa. Foto: Antônio Brasiliano
O pianista Benjamim Taubkin, protagonista de O Piano Que Conversa. Foto: Antônio Brasiliano

“A musica pode ser a fotografia de tudo, e assim conservar toda uma civilização”. A frase, expressa por Benjamim Taubkin em meio a um encontro com amigos bolivianos, é um dos raros momentos do filme O Piano Que Conversa em que a narrativa é desenvolvida por meio da fala. Dirigido por Marcelo Machado, de Tropicália (2012), o longa-metragem conquistou o público do festival de documentários musicais In-Edit Brasil e foi anunciado neste domingo (25), data de encerramento da nona edição da mostra paulistana, como o grande vencedor da categoria Júri Popular (veja os demais premiados na página oficial do evento).

A empatia despertada no público do festival, onde O Piano Que Conversa fez sua pré-estreia mundial, pode ser justamente explicada por seu despojamento. Como o título da obra sugere, a trama intimista e poética construída por Machado é baseada sobretudo nas interlocuções musicais entre Taubkin, seu piano, e um sem número de personagens espalhados em localidades distintas do Brasil, da Bolívia e da Coreia do Sul. Além desses deslocamentos, o longa também retrata, no Brasil, jam sessions com músicos da Polônia, Israel e Moçambique.

Diferentemente do que fez em Tropicália, quando reuniu uma série de depoimentos didáticos para mensurar a importância do movimento que revolucionou a música popular brasileira na transição dos anos 1960 para a década de 1970, Machado revestiu a estética de O Piano Que Conversa de escolhas singelas e subjetivas. Ao perseguir os passos obstinados de um homem que, com o perdão do clichê, respira e transpira música, o diretor soube também retratar a força inerente à música, linguagem universal, de aproximar diferentes culturas e ignorar barreiras geográficas, étnicas e religiosas.

Em dezembro de 2016, estive na Zona da Mata Sul de Pernambuco, no município de Água Preta, para cobrir a segunda edição do festival Arte na Usina (leia a reportagem). Idealizado pelos empresários Ricardo Pessoa de Queiróz e sua esposa, Bruna Simões Pessoa de Queiroz, o evento cultural ressignificou a importância local de uma antiga usina de açúcar da família, a Santa Terezinha, desativada havia mais de 20 anos. Na seara musical, um dos destaques foi Benjamim Taubkin.

Ao longo de uma semana, em meio a artistas e outros colegas de imprensa, fiquei hospedado na mesma casa que acolheu o pianista e pude testemunhar, na intimidade do artista, que Taubkin é o mesmo “personagem” retratado no documentário de Machado. Ao despertar, todos os hóspedes da casa eram inebriados com sua música a invadir as dependências do imóvel, a partir do piano de cauda repousado em um dos cantos da sala de estar. Obcecado pelas teclas pretas e brancas, sem que com isso quisesse impor sua excelência no manejo do instrumento, Taubkin repetia o gesto em outras horas dos dias que ali estivemos, e impregnava o ambiente de beleza e lirismo por horas a fio. Fazia isso com a mesma naturalidade com que hipnotizava os moradores do humilde município pernambucano em suas aparições públicas.

O poder de fascínio deste pequeno grande filme talvez resida aí: na magia de desnudar o artista e revelar o homem, e em seu caráter de valorização da fraternidade num momento em que parte significativa da humanidade insiste em segregar seus pares e ignorar a importância de gestos que deveriam ser cotidianos, como a alteridade e a empatia.

Na seleção de encontros reunidos em O Piano Que Conversa, estão jam-sessions com os guitarristas paraenses Felipe e Manoel Cordeiro e o percussionista carioca radicado em São Paulo Guilherme Kastrup, parceiro de Taubkin, ao lado da também percussionista Simone Sou no projeto Sons de Sobrevivência (encontro registrado em um evento no Capão Redondo, em São Paulo, na sede da Cooperifa); o saxofonista Álvaro Montenegro (Bolívia) e um grupo de músicos locais; o compositor e maestro Jae Hyun Chun, com quem Taubkin desenvolveu o projeto Co-Bra (Coreia do Sul e Brasil); a cantora Lena Bahule (Moçambique), o percussionista Itamar Doari (Israel) e o Grupo Carreira (em uma apresentação no festival Arte Serrinha, sediado em uma fazenda em Bragança Paulista, no interior de São Paulo).

Entre os dias 6 e 12 de julho, O Piano Que Conversa terá sessões diárias, às 21h30, no Cine Sesc, em São Paulo. No dia 15 de julho, também na capital paulista, o filme será exibido, às 19h, no Cine Olido. A projeção será seguida de um bate-papo com Marcelo Machado e Benjamim Taubkin. Ainda sem datas confirmadas, o documentário também será exibido no circuito SP Cine e em salas do Rio de Janeiro, Fortaleza e Natal. O pianista pode ser visto em ação semanalmente às terças-feiras no projeto Al Jam Session, capitaneado por ele no espaço cultural e gastronômico palestino Al Janiah, sediado no Bixiga, em São Paulo. 

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Veja o trailer oficial de O Piano Que Conversa

 


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