Mostra em Fortaleza reúne ícones da arte brasileira

"Abaeté" (1957), José Pancetti. Foto: Divulgação
“Abaeté” (1957), José Pancetti. Foto: Divulgação

“Todo colecionador é de certa forma um obcecado, ao dedicar uma vida inteira a reunir as obras certas.” A frase, do curador Fábio Magalhães, descreve a figura de Airton Queiroz, empresário cearense que possui uma das mais relevantes coleções de arte do País. Seu acervo é composto por cerca de 700 obras que vão do século XVII até o presente, incluindo nomes como Pierre-Auguste Renoir, Frans Post, Candido Portinari e contemporâneos como Hélio Oiticica e Tunga. Parte desses trabalhos pode ser vista agora na exposição Coleção Airton Queiroz, em cartaz no espaço cultural da Universidade de Fortaleza, com curadoria de Fábio Magalhães, José Roberto Teixeira e Max Perlingeiro.

O empresário provém de uma tradicional família cearense. Seu pai, Edson Queiroz, foi fundador da Unifor, uma das mais tradicionais instituições de ensino e filantropia do estado, que durante muitos anos abrigou, no Espaço Cultural da Universidade, a Unifor Plástica, evento que congrega talentos da terra, tendo revelado importantes artistas cearenses. Foi também o pai quem começou a coleção hoje mantida por Airton, cuja primeira tela adquirida foi do pintor cearense Antônio Bandera. Os trabalhos ficam guardados em suas propriedades, ocupando os espaços mais inusitados, como corredores, portas e até mesmo o teto. Porém, o que chama atenção é a qualidade do acervo. “Ele não comprou apenas um Renoir, ele adquiriu um bom Renoir, o que é difícil. O mesmo acontece com Di Cavalcanti, um pintor de altos e baixos, do qual Airton conseguiu obter os melhores”, afirma o curador José Roberto Teixeira.

A mostra em cartaz é composta por 252 obras de 109 artistas, dispostas em cinco salas. Cada espaço pode ser visto como uma exposição separada com princípio, meio e fim. Na primeira parte, são apresentadas telas do século XVII ao XIX, incluindo obras dos viajantes que retrataram o Brasil colônia, como a aquarela Negros Oriundos de Moçambique, de Jean Baptiste Debret, e também trabalhos de brasileiros como Benedito Calixto e Aleijadinho.

Um dos destaques da mostra é a sala dos modernistas. Logo na entrada, há o quadro Mulher de Cabelo Verde, que Anita Malfatti apresentou em 1917 numa exposição individual, considerada uma das precursoras da Semana de 22. A mostra foi alvo de críticas do escritor Monteiro Lobato, que escreveu artigo no qual descrevia as obras como “anormais” e “extravagantes”, numa clara oposição ao modernismo. O artigo está exposto ao lado da tela, evidenciando a conexão entre eles. Na mesma parede, é possível conferir o cartaz da Semana de 1922, feito pelo pintor Emiliano Di Cavalcanti.

Evidenciar o diálogo entre as obras é uma iniciativa da curadoria, que almejou criar uma mostra que falasse com os jovens, conforme afirmou o curador Max Perlingeiro. A mostra conta com uma equipe educativa, que foi preparada pelo crítico Agnaldo Farias, e com recursos tecnológicos para dinamizar a exposição, como um aplicativo que revela curiosidades sobre as obras. Ao contemplar a obra Prometheus II ou Brûlant de ce qu’il brûle, de Maria Martins, por exemplo, o visitante pode acessar a ferramenta e ver o trabalho exposto na Documenta de Kassel, na Alemanha. Os curadores também pediram para a antropóloga Lilian Schwarcz gravar cinco depoimentos curtos que contextualizassem cada parte da exposição. Os vídeos estão localizados na entrada de cada sala da exposição.

O percurso da história da arte também pode ser conferido na sala Presença Estrangeira, que reúne trabalhos que vão do barroco do século XVI, como a obra Cabeça Masculina, de Peter Paul Rubens, uma das mais raras da coleção, até o surrealismo dos espanhóis Joan Miró e Salvador Dalí. Nessa sala também está a pintura Gabrielle, de Renoir, a mais valorizada do acervo, estimada em R$ 4 milhões segundo os curadores. No mesmo espaço ainda há uma sessão exclusiva para os artistas latino-americanos, com obras do uruguaio Joaquín Torres-Garcia, do argentino Leon Ferrari e do mexicano Diego Riveira, cujas duas pinturas expostas, Mulher Comendo Banana e Mãe e Filha, aproximam-se da temática social também abordada pelos modernistas, apresentados na sala ao lado.

No andar de baixo do prédio, estão as duas últimas salas da exposição que apresentam obras da década de 50 até contemporâneos, como Tunga e Leonilson. Há trabalhos de representantes dos grupos concretistas de São Paulo e do Rio de Janeiro, além dos artistas cinéticos Abraham Palatnik e Sérvulo Esmeraldo. Um exemplar da série icônica Bichos, de Lygia Clark, também integra a mostra. 

A mostra impressiona pela quantidade de obras, sendo necessário permanecer bastante tempo, ou até mesmo voltar outro dia, para poder olhar com calma os 252 trabalhos. “Caso nós permanecêssemos dois minutos em cada peça, levaríamos dez horas para ver toda a mostra”, afirma Max Perlingeiro. Em cartaz até 18 de dezembro, a exposição apresenta obras que contam a história da arte brasileira – e parte da internacional -, em um espaço que foge do circuito tradicional do eixo Rio-São Paulo.

Serviço – Coleção Airton Queiroz
De 16 de junho a 18 de dezembro de 2016
Espaço Cultural Airton Queiroz, campus da Universidade de Fortaleza
(85) 3477.3319


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