Está certo a saúde privada adotar as restrições do Sistema Único de Saúde?

Posicionamento recente da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) de seguir decisão da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec) quanto a restrição do acesso a tecnologias no Sistema Único de Saúde (SUS) gerou debates acalorados dos vários atores do setor saúde. A tecnologia em questão é um medicamento para tratamento do câncer de mama, mas o ponto central desta discussão é o precedente que se abre com esta decisão. A ANS deveria seguir as recomendações da Conitec para orientar a decisão sobre as tecnologias a serem cobertas pelas operadoras de planos de saúde?

O usuário de plano de saúde financia o seu acesso ao Sistema Suplementar, diretamente ou através de um empregador, para usufruir de uma infra-estrutura diferente do SUS. Além disto, o beneficiário do plano de saúde espera ter acesso a um conjunto de tecnologias diagnósticas e terapêuticas mais atualizado. Quais deveriam ser os pontos de convergência das decisões da Conitec para orientar as decisões no SUS e no Sistema Suplementar?

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O incremento nos orçamentos dos cuidados de saúde tem levado os mais variados governos a utilizarem os métodos da Avaliação de Tecnologia em Saúde (ATS) para auxiliar decisões relativas ao reembolso de medicamentos e outras tecnologias de saúde. A ATS tornou-se uma área do conhecimento multidisciplinar fundamental para formulação de políticas de saúde, em um cenário de avanço da Pesquisa & Desenvolvimento de novas tecnologias diante de restrições orçamentárias dos financiadores dos cuidados de saúde.

No caso brasileiro, a Conitec primeiro avalia a qualidade e robustez da evidência científica sobre eficácia e segurança da tecnologia. O segundo passo é a análise de custo-efetividade e, por último, faz a análise de impacto orçamentário para o processo decisório de incorporar ou não uma tecnologia em saúde ao SUS.

As avaliações baseadas em evidências científicas da Conitec sobre os atributos de eficácia e segurança das tecnologias de saúde devem ser as mesmas para o SUS quanto para o Sistema Suplementar (partindo do pressuposto que a avaliação é correta), isto é, estes atributos são universais e  cenários independentes.

Porém, a análise de custo-efetividade (eficiência alocativa) e análise de impacto orçamentário (factibilidade) deve ser específica para cada sistema, pois o financiamento do Sistema Suplementar é superior ao SUS para uma população de beneficiários de cerca de 50 milhões, o que representa um gasto per capita aproximadamente quatro vezes maior em comparação ao SUS. Portanto, o acesso promovido pelo Sistema Suplementar a tecnologia é maior.

A sociedade brasileira deve lutar pela melhoria do acesso e da qualidade do SUS e do Sistema Suplementar de Saúde. Não podemos aceitar o caminho de gerar equidade entre os dois sistemas pela opção de restringir o acesso no Sistema Suplementar, sob pena de “socializarmos a pobreza”, frase do notável economista Dr. Roberto Campos.

*Denizar Vianna é professor associado da Faculdade de Medicina da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e especialista em economia da saúde


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